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    Pará incentiva garimpo ilegal ao permitir licenciamento municipal de extração de ouro, diz ação apoiada pelo governo

    Os atos normativos do estado têm o potencial de causar prejuízos para o meio ambiente e as populações indígenas e ribeirinhas

    Garimpo ilegal de ouro em Itaituba, no Pará 04/09/2021 (Foto: REUTERS/Lucas Landau)

    BRASÍLIA (Reuters) - Uma ação apresentada no Supremo Tribunal Federal (STF) com apoio do governo federal busca forçar o governo do Pará a revogar um conjunto de legislações estaduais que dá poderes a municípios paraenses para concederem licenciamento ambiental para a exploração de garimpo de ouro no Estado, que sediará no ano que vem a cúpula do clima da ONU.

    Diversos órgãos federais já alegaram ao Supremo que os atos normativos do Pará, em vigor há pouco mais de 10 anos, incentivam o garimpo ilegal de ouro, contaminam rios com os altamento tóxicos mercúrio e cianeto, e têm o potencial de causar prejuízos para o meio ambiente e as populações indígenas e ribeirinhas.

    Investigações da Polícia Federal e fiscalizações de órgãos federais ambientais como o Ibama apontam que o Pará é um dos Estados brasileiros com as maiores concentrações de garimpos ilegais de minério, alguns deles inclusive dentro de terras indígenas e áreas de proteção.

    A polêmica gira em torno de uma resolução estadual editada inicialmente em 2013, e que foi alterada depois em 2015 e em 2021, delegando a municípios poderes para promover o licenciamento ambiental de lavras garimpeiras de áreas de até 500 hectares -- equivalente a 500 campos de futebol.

    O Partido Verde (PV) entrou com a ação pedindo uma liminar no final do ano passado para suspender os efeitos das normas. A legenda alegou ao Supremo que o Pará é o único Estado da Amazônia Legal a fazer este tipo de delegação, o que contraria a Lei da Lavra Garimpeira de 1989.

    Essa lei federal -- que teria ascendência sobre a legislação estadual em vigor -- limita a área de lavra a uma área dez vezes menor, de 50 hectares, e para uma única pessoa, podendo chegar a 1 mil hectares no caso de uma cooperativa de garimpeiros.

    Esse impasse ocorre no momento em que o Pará se prepara para sediar a principal conferência de meio ambiente do mundo, a COP30, em novembro de 2025.

    O processo é relatado pelo ministro Luiz Fux, que pediu manifestação e informações aos órgãos envolvidos antes de tomar uma decisão.

    IMPACTO

    O Ibama disse na ação que, ao contrário do defendido pelo governo estadual, a atividade garimpeira não tem apenas abrangência local e extrapola os municípios. Afirmou ainda que há uso de produtos tóxicos como mercúrio nas lavras com impacto para a saúde pública e fauna.

    A Polícia Federal apontou ter identificado 15.6568 alertas de extração mineral ilegal no Estado do Pará.

    Um laudo pericial da PF, anexado ao processo e visto pela Reuters, apontou que normalmente há o uso de técnicas de lixiviação por cianeto ou da amalgamação com mercúrio na separação do ouro no garimpo ao longo do Rio Tapajós, importante rio do Estado.

    "Ambos são bastante tóxicos ao meio ambiente e à saúde humana, e foram encontrados nos principais afluentes do Tapajós, em especial aqueles com intensa atividade garimpeira", afirmou o documento.

    Os peritos relataram que, em vários pontos de amostras coletadas, os níveis de contaminação estavam "acima do limite tolerável", sendo que os locais são habitados por populações ribeirinhas e indígenas, que dependem da pesca para subsistência.

    Em manifestação separada, o advogado-geral da União, Jorge Messias, defendeu a suspensão das normas estaduais.

    "Além de divergirem do regramento federal, tais atos normativos incentivam a prática de garimpo ilegal, bem como reduzem a capacidade de controle estatal no tocante à exploração da atividade minerária, causando, por conseguinte, notáveis prejuízos para o meio ambiente e para as populações indígenas que vivem nas áreas afetadas pelo garimpo", afirmou Messias ao Supremo.

    POTENCIAL

    Procurada pela Reuters, a Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) do Pará informou que a norma que definiu o porte e potencial poluidor de empreendimentos e atividades de competência do licenciamento municipal partiu do Conselho Estadual de Meio Ambiente, entidade que reúne representantes do Poder Público e da sociedade civil.

    "Esclarece ainda que a tipologia de lavra garimpeira com porte de até 500 hectares foi definida pelo Conselho em 2014, portanto, anterior à atual gestão", disse.

    "Atualmente, por meio de uma Câmara Técnica criada especificamente para essa finalidade, no âmbito do Conselho Estadual de Meio Ambiente, o Estado está rediscutindo os termos da resolução", ressaltou.

    Na própria ação, o governo estadual havia se manifestado inicialmente argumentando que há 10 anos a regra está em vigor, destacando que a gestão ambiental está de acordo com o que está previsto na Constituição. Para o Estado, cabe ao Ibama fiscalizar apenas as áreas federais.

    O Pará também afirmou que a atividade de lavra no Estado está de acordo com uma portaria da Agência Nacional de Mineração, que permite o regime de lavra garimpeira de até 10 mil hectares na Amazônia Legal.

    "Nessa conjuntura, no Estado do Pará, a competência dos municípios para o licenciamento da atividade de lavra garimpeira em áreas de até 500 hectares não se avulta como desproporcional, correspondendo a 5% (cinco por cento) da área máxima para a atividade dentro da Amazônia Legal", considerou.

    Contudo, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, deu parecer a favor da ação do PV para suspender os efeitos das normas que delegam poderes aos municípios para concederem licenciamento de garimpo. Para ele, a legislação estadual poderia apenas fixar normas mais restritivas do que a prevista pelo ente federal. No entanto, foi o contrário que ocorreu.

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