"O golpe deu certo na educação": Thiago Esteves alerta sobre retrocessos e desmonte no setor
Especialista denuncia domínio da extrema direita nas comissões de educação e influência empresarial sobre políticas públicas
247 - Em entrevista ao programa Boa Noite 247, o professor e pesquisador Thiago Esteves fez uma análise preocupante sobre os rumos da educação no Brasil e denunciou o avanço da extrema direita sobre as comissões responsáveis pelo setor. Segundo ele, a recente definição da presidência da Comissão de Educação da Câmara dos Deputados reflete um processo contínuo de desmonte.
Esteves destacou que, após a presidência de Nikolas Ferreira (PL-MG), a comissão passa a ser liderada por Maurício Carvalho (União Brasil-RO), um empresário do setor educacional e vice-reitor de uma universidade particular de sua própria família. "Não é mera coincidência que seu sobrenome seja Carvalho. Ele é vice-reitor da universidade da família dele. Isso me preocupa bastante", alertou.
Privatização, dinheiro público e o poder das emendas - A nomeação de Carvalho ocorre em um contexto delicado, pois a Comissão de Educação tem influência direta sobre a destinação de recursos públicos. "A educação é a segunda área que mais recebe verbas federais, atrás apenas da saúde. E com esse modelo de emendas Pix e de relator, estamos falando de uma verdadeira fortuna sob controle dessas comissões, e em ano eleitoral", afirmou Esteves.
Ele ressaltou que a captura do debate educacional por empresários pode intensificar a privatização do ensino e a influência de setores conservadores sobre as políticas públicas. "Ao invés de um parlamentar ligado à educação pública, temos um empresário do ensino privado ocupando um posto estratégico na Câmara. Isso indica que os interesses do setor privado prevalecerão sobre a construção de uma educação pública de qualidade", disse.
Militarização, religião nas escolas e a nova ofensiva conservadora - Esteves também denunciou o avanço da militarização e do fundamentalismo religioso nas escolas. "Além das escolas cívico-militares e da precarização da profissão docente, agora temos os chamados 'intervalos bíblicos', onde pastores e missionários entram nas escolas públicas para fazer orações e conversões forçadas de crianças e adolescentes", revelou.
Ele criticou a normalização desse tipo de prática, que ameaça a laicidade da educação. "Estamos falando de alunos e professores sendo forçados a professar uma fé dentro do espaço escolar. Isso fere a Constituição e reforça um projeto de ensino pautado pelo fundamentalismo", afirmou.
Além disso, mencionou os casos de repressão dentro das escolas militarizadas. "Recebi recentemente o áudio de uma mãe desesperada porque sua filha queria ligar para casa e foi ameaçada de ser levada em um camburão. A educação virou isso", lamentou.
"O Escola Sem Partido não morreu, só mudou de forma" - Outro ponto levantado por Esteves foi a persistência da doutrinação conservadora no ensino, mesmo após a inconstitucionalidade do projeto Escola Sem Partido. "A lógica do Escola Sem Partido continua viva. Professores seguem sendo perseguidos e conteúdos fundamentais, como filosofia e sociologia, estão sendo retirados do currículo ou esvaziados de sentido", explicou.
Ele mencionou a recente exclusão das ciências humanas do processo seletivo do Instituto Federal (IF) como um exemplo desse retrocesso. "O golpe na educação também passa pelo apagamento das ciências humanas e pela substituição de conteúdos críticos por uma lógica de empreendedorismo precário. Não é coincidência que os livros didáticos estejam ensinando mais sobre brigadeiro gourmet do que sobre Karl Marx", ironizou.
O avanço do setor empresarial e a desvalorização do professor - Thiago Esteves denunciou ainda a influência de grandes empresas e fundações privadas sobre as políticas educacionais do país. "O ex-presidente da Câmara, Arthur Lira, participou recentemente de um evento do movimento Todos Pela Educação, financiado por institutos empresariais que lucram com a educação. Esses grupos estão moldando a política educacional brasileira e, infelizmente, até o Ministério da Educação participou desse evento", revelou.
Ele também criticou a progressiva privatização do material didático nas escolas públicas. "Aplicativos e plataformas privadas estão substituindo os professores na elaboração de provas e avaliações. Em estados como São Paulo e Paraná, os docentes já não elaboram mais as provas, que vêm prontas das secretarias. Se o professor não segue exatamente o roteiro imposto por esses sistemas, o aluno é prejudicado. Isso tira completamente a autonomia pedagógica do educador", afirmou.
"O orçamento da educação foi golpeado" - Além dos ataques institucionais, Esteves alertou sobre os cortes no orçamento da educação aprovados pelo Congresso Nacional. "O setor da educação sofreu um golpe grande no orçamento federal. Isso compromete programas importantes, como o Pé-de-Meia, que é um dos melhores projetos do governo Lula", lamentou.
Ele enfatizou que o controle do orçamento por uma maioria conservadora no Congresso tem como objetivo reduzir investimentos na educação pública e direcionar verbas para setores privados. "A lógica é clara: menos dinheiro para a educação pública, mais espaço para empresários da educação lucrarem com o ensino privado. O objetivo é desmontar qualquer projeto de inclusão e universalização da educação", afirmou.
"A luta será inglória, mas não podemos desistir" - Esteves concluiu a entrevista com um alerta sobre o desafio dos próximos anos. "A nossa luta será uma luta inglória. Vamos precisar enfrentar a extrema direita dentro das escolas, a criminalização dos professores, a militarização, o fundamentalismo religioso e o domínio do empresariado sobre a política educacional. Mas não podemos desistir", afirmou.
O professor reforçou a necessidade de mobilização de educadores, estudantes e sociedade civil para impedir que a educação pública brasileira seja completamente capturada por interesses privados e fundamentalistas. "Ou a gente se organiza, ou a gente perde a guerra para o fascismo dentro das escolas", finalizou.
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