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    Washington Araújo

    Jornalista, escritor, professor da UnB, tem 17 livros sobre mídia e direitos humanos. Autor do blog de jornalismo e cultura Cidadaodomundo.org

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    Big Techs e a manipulação digital: o novo colonialismo do século XXI

    "Um dos efeitos mais perversos das redes sociais é a proliferação de bolhas ideológicas", escreve o colunista Washington Araújo

    (Foto: Divulgação)

    As redes sociais, há não muito tempo celebradas como ferramentas de democratização da informação e conexão global, transformaram-se em mecanismos de controle e manipulação. A lógica implacável dos algoritmos, que priorizam o engajamento a qualquer custo, criou um ambiente onde a verdade se torna maleável e as emoções são exploradas com maestria, mantendo os usuários em um ciclo vicioso de consumo de conteúdo.

    Os algoritmos das redes sociais são meticulosamente projetados para maximizar o engajamento, muitas vezes à custa da verdade e da saúde mental dos usuários. Conteúdos polarizadores, notícias falsas e discursos de ódio são impulsionados com precisão cirúrgica, pois geram reações emocionais intensas, enquanto informações complexas e nuances são deliberadamente ignoradas. Isso cria um ambiente onde as "bolhas" ideológicas se fortalecem, e o diálogo entre diferentes grupos se torna cada vez mais raro.

    Dados da Universidade da Califórnia revelam que usuários de redes sociais tendem a consumir informações que confirmam suas crenças preexistentes, um fenômeno conhecido como viés de confirmação. Além disso, pesquisas do Instituto Reuters apontam que a polarização política online está diretamente relacionada ao aumento do discurso de ódio.

    A ascensão das bolhas ideológicas

    Um dos efeitos mais perversos das redes sociais é a proliferação de bolhas ideológicas. Essas bolhas se formam quando os algoritmos identificam padrões de comportamento e preferências dos usuários, alimentando-os com conteúdos que reforçam suas crenças e visões de mundo. O resultado é um ambiente onde os indivíduos são constantemente expostos a informações que confirmam suas opiniões, enquanto perspectivas divergentes são sistematicamente excluídas.

    Dados da Universidade de Michigan revelam que usuários de redes sociais tendem a se agrupar em comunidades online com visões de mundo semelhantes, o que reforça a polarização. Além disso, estudos do Instituto Reuters apontam que a exposição a diferentes perspectivas online diminui a polarização política.

    Os algoritmos das redes sociais são projetados para explorar nossas emoções. Eles identificam quais tipos de conteúdo geram reações mais intensas — seja raiva, medo, alegria ou surpresa — e priorizam esses conteúdos em nossas timelines. Essa estratégia é eficaz para manter os usuários engajados, mas tem um custo elevado para a saúde mental e o bem-estar coletivo.

    Pesquisas da Universidade da Pensilvânia mostram que o uso excessivo de redes sociais está associado a um aumento nos níveis de estresse e ansiedade. Além disso, dados da OMS revelam que a depressão é uma das principais causas de incapacidade em todo o mundo, e o uso de redes sociais desempenha um papel significativo nesse problema.

    Desinformação como Arma

    A desinformação se tornou uma das armas mais poderosas das redes sociais. Notícias falsas, teorias da conspiração e conteúdos manipulativos se espalham rapidamente, muitas vezes com o objetivo de influenciar eleições, desestabilizar governos ou promover agendas específicas. A velocidade com que a desinformação se propaga é assustadora, e seu impacto na sociedade é profundo.

    Um estudo do MIT revelou que notícias falsas se espalham 70% mais rápido que as verdadeiras, sublinhando o impacto da desinformação. Além disso, um estudo do Centro Internacional para o Jornalismo revelou que a desinformação online está diretamente ligada à queda da confiança na mídia tradicional.

    Ataque aos Pilares da Sociedade

    As redes sociais e as Big Techs não se limitam a influenciar o consumo ou as eleições. Elas atacam diretamente os pilares das democracias ocidentais: a liberdade de imprensa, as eleições livres e periódicas e a independência do judiciário. Ao normalizar notícias falsas e semear confusão entre fatos e opiniões, essas plataformas corroem a credibilidade da mídia tradicional e debilitam a capacidade dos cidadãos de tomar decisões informadas.

    Dados da Freedom House apontam para um declínio global na liberdade de imprensa, com as redes sociais desempenhando um papel significativo nesse processo. A estratégia é clara: bombardear os usuários com informações contraditórias até que a verdade se torne irrelevante.

    As redes sociais, que floresceram como instrumentos de democratização da informação e conexão global, hoje operam sob uma lógica que evoca o colonialismo mercantilista do século XVII. As Big Techs, a exemplo da Companhia das Índias Orientais em seu apogeu, são entidades que buscam incessantemente o lucro e o poder, com desdém pelas responsabilidades éticas ou sociais.

    Estima-se que as Big Techs detenham um valor de mercado combinado superior a US$ 10 trilhões, ultrapassando o PIB de muitas nações. Além disso, um estudo da Universidade de Oxford aponta que o Facebook (Meta) influencia o debate político em mais de 70 países.

    A Lavagem Cerebral Digital

    As redes sociais realizaram uma verdadeira lavagem cerebral na sociedade. Elas fomentaram a dependência, desencadearam síndromes de abstinência e criaram um ambiente onde o extremismo é recompensado. Conteúdos que geram engajamento são aqueles que exploram emoções extremas, seja através de histórias comoventes ou de discursos de ódio.

    Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) revelam que o uso excessivo de redes sociais está associado a um aumento nos casos de ansiedade e depressão, especialmente entre os jovens. Além disso, pesquisas do Centro de Estudos sobre o Extremismo mostram que a radicalização online é um problema crescente.

    Diante desse cenário, a regulamentação das redes sociais e das Big Techs se torna uma necessidade premente. A Europa tem liderado esse movimento com leis como o GDPR e o DSA, que buscam garantir maior transparência e responsabilidade das plataformas. No entanto, a regulamentação por si só não é suficiente.

    A educação midiática desempenha um papel crucial nesse contexto. Capacitar os cidadãos a identificar fontes confiáveis, compreender o funcionamento dos algoritmos e reconhecer os mecanismos de manipulação é fundamental para fortalecer a democracia e resistir à desinformação.

    A sociedade civil tem um papel vital na luta por um ambiente digital mais justo e seguro. Organizações não governamentais, grupos de defesa dos direitos digitais e ativistas têm trabalhado incansavelmente para expor práticas antiéticas e pressionar por mudanças.

    A colaboração entre governos, empresas, educadores e cidadãos é inadiável para garantir que as redes sociais e as Big Techs operem de forma ética e transparente. Somente assim poderemos aproveitar o potencial positivo da tecnologia e construir um futuro onde democracia, liberdade e justiça prevaleçam.

    *

    As redes sociais e as Big Techs transformaram-se em poderosas ferramentas de controle e manipulação, com impactos profundos na sociedade, na política e na saúde mental. A manipulação algorítmica, a fragmentação social, a exploração das emoções humanas e a desinformação são apenas alguns dos desafios que enfrentamos. A regulamentação e a educação midiática são passos essenciais para mitigar esses efeitos e garantir um futuro digital mais justo e democrático. A sociedade civil, os governos e as empresas devem trabalhar juntos para enfrentar esses desafios e proteger os valores fundamentais da democracia.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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