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      Sara York

      Sara Wagner York ou Sara Wagner Pimenta Gonçalves Júnior é bacharel em Jornalismo, licenciada em Letras Inglês, Pedagogia e Letras vernáculas. Especialista em educação, gênero e sexualidade, primeiro trabalho acadêmico sobre as cotas trans realizado no mestrado e doutoranda em Educação (UERJ) com bolsa CAPES, além de pai, avó. Reconhecida como a primeira trans a ancorar no jornalismo brasileiro pela TVBrasil247.

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      Brasil e EUA em Tempos de Incerteza: Análise do Washington Brazil Office Aponta Caminhos para Cooperação Bilateral

      "O recente documento estratégico do Washington Brazil Office analisa os impactos das políticas adotadas pela administração de Donald Trump"

      (Foto: Alan Santos/PR)

      O recente documento estratégico do Washington Brazil Office analisa os impactos das políticas adotadas pela administração de Donald Trump sobre comunidades migrantes, com foco especial na diáspora brasileira nos Estados Unidos. O texto destaca como medidas severas de deportação agravaram vulnerabilidades legais e socioeconômicas, provocando rupturas familiares e instabilidade comunitária. Além disso, o relatório expressa preocupação com o enfraquecimento de compromissos com os direitos humanos, apontando que a retórica hostil aos imigrantes promoveu um ambiente de exclusão e tensão social. No contexto brasileiro, o documento alerta para a influência crescente de políticos alinhados à extrema-direita americana, o que pode comprometer ainda mais os direitos de populações marginalizadas. Assim, o relatório não apenas denuncia os efeitos locais das políticas de Trump, mas também reflete sobre suas implicações geopolíticas e humanitárias mais amplas.

      A reeleição de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos em 2024 provocou reverberações imediatas no cenário internacional. Entre os impactos mais significativos está o reposicionamento das relações entre os Estados Unidos e o Brasil, duas das maiores democracias do hemisfério ocidental, com histórias entrelaçadas por laços econômicos, culturais e diplomáticos de longa data. É nesse contexto que o Washington Brazil Office (WBO) publicou, em março de 2025, um Policy Paper que analisa os novos desafios geopolíticos e propõe estratégias para fortalecer a cooperação bilateral em tempos de polarização e incerteza.

      Diálogo em Tempos de Polarização

      O documento parte de um princípio básico, mas essencial: apesar das diferenças ideológicas e das flutuações políticas internas, Brasil e Estados Unidos têm interesses estratégicos comuns. Entretanto, o cenário atual apresenta obstáculos significativos. Enquanto o segundo mandato de Trump promete uma agenda marcada por nacionalismo econômico, rigidez migratória e negacionismo climático, o governo Lula no Brasil enfrenta o desafio de equilibrar desenvolvimento social com preservação ambiental, ao mesmo tempo em que busca retomar o protagonismo internacional do país.

      O WBO propõe que, para além das divergências, os dois países devem encontrar pontos de convergência, fomentando o diálogo interinstitucional e envolvendo ativamente a sociedade civil. A polarização não pode ser um impeditivo para uma relação madura e construtiva.

      Democracia em Xeque

      Um dos eixos centrais do documento é a análise do estado da democracia em ambos os países. A ascensão de discursos autoritários, o enfraquecimento das instituições e a disseminação de desinformação colocam em risco os pilares democráticos. No Brasil, episódios como os ataques de 8 de janeiro de 2023 ao Congresso Nacional revelam a vulnerabilidade das instituições. Nos EUA, o legado do trumpismo se traduz em desconfiança em relação às eleições e no aumento da radicalização política.

      O WBO sugere um pacto bilateral pela integridade da informação, que envolva regulação das plataformas digitais, promoção da educação midiática e fortalecimento de veículos jornalísticos independentes. A sociedade civil, especialmente movimentos sociais, ONGs e universidades, é apontada como peça-chave para fiscalizar, denunciar abusos e defender os direitos civis.

      Desenvolvimento Sustentável: Uma Balança Instável

      Na seara ambiental, o documento observa que há retrocessos significativos no horizonte. A administração Trump tem dado sinais de que irá retirar novamente os EUA de compromissos multilaterais sobre o clima e facilitar atividades de exploração de combustíveis fósseis. Enquanto isso, o governo brasileiro tenta reverter os danos da era Bolsonaro, reativando órgãos como a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e demarcando novas terras indígenas — mas enfrenta a resistência de setores econômicos e do Congresso.

      O WBO recomenda que ambos os países adotem uma política ambiental inclusiva e multissetorial, que combine desenvolvimento econômico com justiça climática, respeitando os direitos dos povos tradicionais e garantindo sua participação efetiva nas decisões sobre seus territórios.

      Imigração e Incertezas

      Outro ponto de tensão abordado no documento é a política migratória. A gestão Trump tem histórico de endurecimento nas fronteiras e deportações em massa, impactando diretamente a comunidade brasileira nos EUA — estimada, extraoficialmente, em mais de 1,5 milhão de pessoas. O relatório mostra que muitos desses imigrantes vivem em situação irregular, com acesso precário a serviços de saúde, educação e assistência consular.

      Para mitigar esse cenário, o WBO sugere a celebração de acordos bilaterais de regularização migratória, que garantam proteção legal, acesso a direitos e maior presença do Estado brasileiro no exterior por meio de consulados, centros de acolhimento e campanhas de informação.

      Comércio e Governança Global

      No campo econômico, a tendência protecionista dos EUA pode ter impactos profundos sobre exportações brasileiras, especialmente nos setores do agronegócio, tecnologia e energia. O relatório propõe a diversificação dos mercados, reforço de parcerias comerciais com países do Sul Global e negociações transparentes com os EUA, especialmente em temas como tarifas, barreiras sanitárias e subsídios.

      Em relação à governança global, o WBO destaca que o Brasil deve reforçar sua presença em fóruns multilaterais — como ONU, OMC e G20 — buscando equilíbrio nas disputas entre EUA e China. O apoio americano a uma maior participação do Brasil em instâncias de decisão global, como o Conselho de Segurança da ONU, é visto como um passo estratégico para uma ordem internacional mais equitativa.

      Um Chamado à Ação

      O “Policy Paper” do Washington Brazil Office não se limita a diagnósticos. É, sobretudo, um convite à ação estratégica e colaborativa, destacando que o futuro das relações Brasil-EUA dependerá da capacidade de ambos os países de superar divergências ideológicas em nome de objetivos comuns: fortalecimento democrático, desenvolvimento sustentável, defesa dos direitos humanos e prosperidade econômica.

      A cooperação entre governos, setor privado e sociedade civil aparece como o alicerce para enfrentar os desafios do século XXI. Em tempos de fragmentação política e crise de confiança nas instituições, construir pontes — e não muros — é o imperativo que deve guiar as lideranças das duas nações.

      O documento do WBO é um alerta, um guia e uma ferramenta de ação para todos aqueles que acreditam que o diálogo ainda é possível, e que as relações internacionais podem — e devem — ser construídas com base na solidariedade, no respeito mútuo e na justiça global. Apesar de seu caráter abrangente e do foco em temas centrais como democracia, imigração e direitos humanos, o documento do Washington Brazil Office peca por uma omissão grave: em nenhum momento nomeia diretamente os ataques contínuos à população trans e a outras comunidades sistematicamente marginalizadas. Em um cenário político global onde a retórica de ódio contra pessoas LGBTQIA+, especialmente pessoas trans, tem se intensificado — muitas vezes alimentada justamente por discursos e políticas de líderes da extrema-direita como Donald Trump e seus aliados internacionais — o silêncio do documento soa ensurdecedor. Ignorar essa realidade é não apenas um erro estratégico, mas também uma falha ética. Nomear é reconhecer a existência e a urgência da proteção. Ao deixar de fazê-lo, o texto corre o risco de reproduzir a mesma lógica de apagamento que denuncia em outros contextos.

      * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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