Ficar cobrando Gonet é "efeito manada"
"Vamos desprezar esses fatos tonitruantes só para a opinião pública não ficar ansiosa? Ora, criemos um bolsa ansiolítico"
"Efeito manada" é um fenômeno da psicologia social que os cientistas políticos, entre outros, estudam. Pode, no entanto, ser aplicado aos contextos político ou financeiro. O termo descreve a tendência das pessoas de seguirem "gatilhos" detonados por influenciadores que as levam a se pautar pelas opiniões da maioria do seu grupo.
O efeito manada é uma tendência de seguir as ações ou opiniões de um grupo sem questionar ou analisar individualmente as informações disponíveis. É um viés comportamental comum que pode influenciar decisões em diversos contextos, como no dia a dia ou no mundo dos investimentos.
Por exemplo: se você faz uma campanha para espalhar que um banco está quebrando, se tal campanha for suficientemente estridente as pessoas correrão ao banco para sacar seus proventos. Ou seja, você cria uma profecia autorrealizável.
No contexto político, temos um exemplo no bolsonarismo, que consegue direcionar seus militantes para onde quiser, contanto que o influenciador dominante -- no caso, Jair Bolsonaro -- aponte a direção. Na esquerda mais sanguínea, isso vem acontecendo muito em relação a teorias da conspiração, que também atingem com igual intensidade a extrema-direita.
Seria possível citar muitas teorias da conspiração que certa esquerda abraça tanto quanto certa direita, mas vamos nos concentrar em uma só: a teoria conspiratória de que o Sistema de Justiça brasileiro está fazendo corpo-mole em relação a Jair Bolsonaro.
Na segunda-feira da semana passada, entrevistei um dos juristas que foi cotado para a vaga de Ricardo Lewandowski para o Supremo, o professor da PUC-SP doutor Pedro Serrano, que, coincidentemente, defendeu-me da ofensiva de Sergio Moro contra mim em 2017.
Entrevistei Serrano devido a um processo assustador que se abateu sobre o espectro político brasileiro nos seus meridianos direito e esquerdo: a teoria da conspiração.
No caso, trata-se de teoria conspiratória sobre o procurador-geral da República, Paulo Gonet, que seria o grande culpado pela "demora" por Jair Bolsonaro ainda não ter sido encarcerado pelos crimes que muito mais do que aparentemente deve ter cometido.
Antes de falar da entrevista, porém, vamos entender que, apesar da culpa (ultra) aparente de Bolsonaro, em um país onde há democracia de fato -- que certa esquerda chama de "democracia burguesa" --, a presunção de inocência deve valer para gregos e troianos, ou seja, devemos defendê-la até para os inimigos porque, amanhã, poderemos ter que nos servir dela.
Ah, Eduardo, mas Lula foi julgado e preso sumariamente. Já abordei várias vezes o processo que levou o hoje presidente da República ao cárcere, lembrando que a denúncia do Triplex ficou flanando pelo cenário político por cerca de cinco anos até que ele fosse denunciado pelo famigerado Power Point de Deltan Dallagno. Dali em diante, sim, foi rápido: em cerca de um ano e meio Lula foi denunciado, julgado em duas instâncias, condenado e preso.
Encarcerado em 2018, porém, foi libertado em 2019 e se elegeu presidente em 2022. Supõe-se que ninguém que peça Bolsonaro preso queira que ele vire o jogo dessa forma, não é mesmo?
Ah, mas Lula era inocente e Bolsonaro é culpado. Concordo que Lula era inocente, mas para dizer que Bolsonaro é culpado é preciso que a Polícia (Federal) o investigue, que o Ministério Público (PGR) o denuncie e que a Justiça (STF) o condene. E que a condenação transite em julgado, conforme determina o texto constitucional.
Eis que se faz, então, a pergunta certa: como Gonet vai denunciar Bolsonaro se a Polícia Federal não concluiu as investigações? Ah, mas o PGR poderia denunciar Bolsonaro nos casos do cartão de vacinação e das joias.
Pergunta: por que tisnar a higidez do processo penal contra o ex-presidente se o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, está rouco de tanto explicar que a investigação demonstra que inquéritos do cartão de vacinação, das joias, do 8 de janeiro e da Abin Paralela integram, todos, o crime macro, de tentativa de golpe?
Voltemos ao professor Serrano, então. Na entrevista que me concedeu, deixou muito claro que "não há nada que indique que toda a investigação dará em nada".Disse, também, que o processo de persecução penal do ex-presidente e da sua organização criminosa (orcrim) não pode se submeter às aflições da opinião pública ou da opinião publicada. Ponto.
Há vários outros juristas que se posicionam da mesma forma. Por exemplo, o ex-desembargador Wálter Faganiello Maierovitch, que igualmente explica que Gonet está construindo um mosaico contra Bolsonaro e que precisa das peças finais (inquérito do 8 de janeiro) para montar o quadro que embasará a denúncia. E que, por isso, "está certo".
Pergunta: a Polícia Federal já concluiu o inquérito? Não, o diretor-geral da PF, doutor Andrei Augusto Passos Rodrigues, já explicou MIL VEZES que o inquérito está em vias de conclusão, mas foram aparecendo fatos novos que não dá para desprezar só para saciar a ansiedade da opinião pública.
Fatos novos como, lá atrás, a Abin paralela e, agora, novas mensagens no celular de Mauro Cid, obtidas na nuvem com equipamento isralense, que mostraram, "apenas", um plano para sequestrar o então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva.
Vamos desprezar esses fatos tonitruantes só para a opinião pública não ficar ansiosa? Ora, criemos um bolsa ansiolítico e esperemos que o processo de persecução penal seja inatacável e, assim, livre-nos de vez do lider da extrema-direita brasileira, que, anulado, fará desmoronar toda essa ameaça fascista em um formidável efeito-dominó.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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