Defesa de acusados pela morte de Rubens Paiva critica retomada do caso: "até o cinema impulsiona o Judiciário brasileiro"
Após anos de estagnação, o processo que investiga os responsáveis pela morte e tortura do ex-deputado voltou a ganhar atenção da Justiça
247 - O processo judicial que investiga os responsáveis pela morte e tortura do ex-deputado Rubens Paiva, ocorrido em 1971, durante a ditadura militar, voltou a ganhar destaque nos tribunais após anos de estagnação. A ação, que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) sob a análise do ministro Alexandre de Moraes, estava parada desde 2018, até que, no final de novembro de 2024, novos desdobramentos surgiram. Esse movimento coincidiu, segundo o Metrópoles, com o lançamento do filme "Ainda Estou Aqui", que reconta a história de Paiva, trazendo à tona novamente o caso.
A Procuradoria-Geral da República (PGR), ao ser consultada pelo ministro Moraes, se manifestou no dia 21 de novembro, afirmando que seria mais apropriado aguardar uma decisão sobre o recurso extraordinário que trata da aplicação da Lei da Anistia, em vigor desde o fim da ditadura.
O processo sobre a morte de Rubens Paiva tem enfrentado obstáculos significativos, com a defesa dos acusados criticando a forma como o caso tem sido tratado. Segundo o advogado Rodrigo Roca, a reação recente da PGR ao caso foi "decepcionante". A defesa ainda destacou que a movimentação judicial parece estar sendo influenciada pela repercussão do filme, questionando a seriedade do sistema judiciário brasileiro. "É a constatação de que agora até o cinema impulsiona o Judiciário brasileiro. Isso é muito frustrante. O processo ficou parado 10 anos e editaram um filme, lançaram um filme candidato ao Oscar sobre o tema e o processo voltou a andar, quer dizer, a mensagem que fica do Brasil no cenário internacional é de que os órgãos públicos brasileiros só se mexem quando tem alguém olhando”, afirmou a defesa.
Além das críticas à condução do processo, a defesa também argumenta que o caso deveria ser arquivado com base na Lei da Anistia, uma vez que, de acordo com o advogado, "boa parte dos envolvidos já morreu", sendo inviável prosseguir com o julgamento. Roca ainda lembrou que questões sobre a aplicação da anistia já haviam sido debatidas anteriormente, inclusive em julgamentos passados no STF. “O ministro Teori Zavascki concedeu a liminar para suspender o andamento da ação penal. Essa liminar foi referendada pelo ministro Alexandre de Moraes. O Supremo Tribunal Federal já enfrentou esse tema algumas vezes", reiterou.
Acusados e Defesas - A denúncia original de homicídio e ocultação de cadáver foi formalizada em 2014 pelo Ministério Público Federal (MPF), que acusou cinco militares pelo envolvimento na morte de Rubens Paiva. Entre os acusados está o general José Antônio Nogueira Belham, que na época do crime comandava o Destacamento de Operações e Informações (DOI), unidade militar onde Paiva foi torturado até a morte. O caso gerou controvérsia desde o início, especialmente devido à persistência de dúvidas sobre os detalhes da execução do crime, que envolvem também outros acusados, como o major Jacy Ochsendorf e Souza e o capitão Raimundo Ronaldo Campos.
No entanto, com a morte de três dos acusados, a ação judicial ficou ainda mais desafiadora. De acordo com a defesa dos militares, o fato de o STF já ter abordado o tema várias vezes e a inexistência de novos elementos robustos tornam desnecessária a continuidade do processo. Para o advogado, o caso deveria ser arquivado, e o STF, em sua opinião, já demonstrou claramente sua posição ao suspender o andamento da ação no passado. A defesa espera que o STF, ao reavaliar o caso, finalize este capítulo da história sem novas movimentações. Espera-se que “o Supremo Tribunal Federal mantenha a posição que ensaiou até o presente momento, ou seja, que se ponha definitivamente uma pá de cal sobre esse assunto e que a reclamação seja julgada procedente", afirmou.
General José Antônio Nogueira Belham : um militar com salário elevado - José Antônio Nogueira Belham, um dos acusados pelo assassinato de Rubens Paiva, segue recebendo uma remuneração básica bruta de R$ 35.991,46. Atualmente vivendo em Brasília, Belham mantém a patente de marechal, uma honraria reservada a oficiais de alta patente com trajetória excepcional. O general comandou o DOI no Rio de Janeiro no período em que Paiva foi capturado e morto. A defesa de Belham nega seu envolvimento nas torturas e na morte de Paiva, mas os registros oficiais e as denúncias do Ministério Público indicam um papel ativo de Belham e de seus subordinados no assassinato.
O papel da memória e da cultura na Justiça - A morte de Rubens Paiva é emblemática da repressão imposta pela ditadura militar brasileira, e a luta pela justiça para ele e outros desaparecidos políticos continua a ser um desafio não apenas jurídico, mas também cultural. O filme "Ainda Estou Aqui", dirigido por Walter Salles e inspirado no livro de Marcelo Rubens Paiva, filho do ex-deputado, ajudou a trazer à tona o sofrimento da família e a busca pela verdade, reavivando as lembranças do período sombrio da ditadura. O filme também expôs as complexas relações entre memória histórica, cinema e justiça, mostrando como a arte pode, muitas vezes, funcionar como um catalisador para a ação social e judicial.
Rubens Paiva, engenheiro e ex-deputado federal, foi um dos maiores símbolos da resistência contra o regime militar. Sua morte, após ser preso, torturado e desaparecido pelo regime, se tornou um marco na história do Brasil. Em 1996, o governo brasileiro reconheceu oficialmente sua morte, embora seu corpo nunca tenha sido encontrado. Paiva foi preso em 1971, após ser levado de sua casa, no Rio de Janeiro, e submetido a torturas que resultaram em sua morte no DOI. O fato de o corpo de Paiva jamais ter sido encontrado e de a narrativa oficial ter sido manipulada por anos, com a alegação de fuga durante uma transferência de prisão, só foi desmascarada anos depois.
A luta de sua esposa, Eunice Paiva, e seus filhos pela verdade e justiça continua até hoje, e a recente movimentação do processo judicial é mais um capítulo dessa luta.
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