Em meio à tensão nos mercados, economistas cobram pacote de corte de gastos mais estrutural
Especialistas alertam que medidas pontuais podem frustrar expectativas; necessidade de um pacote robusto e duradouro é consenso entre analistas
247 – As incertezas em torno do aguardado pacote de corte de gastos da equipe econômica do governo têm gerado apreensão nos mercados. Economistas defendem que o governo deve ir além de ações pontuais, estruturando um pacote que ofereça uma resposta consistente às preocupações fiscais e construa uma narrativa de maior estabilidade para os próximos anos, segundo aponta reportagem do jornal Valor.
Com a série de medidas ainda indefinidas e constantes desmentidos, o mercado vê como crucial que o pacote chegue a pelo menos R$ 30 bilhões para atender às expectativas, embora o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tenha sinalizado desconhecimento sobre como esse valor surgiu na mídia. Pedro Schneider, economista do Itaú Unibanco, alerta que o impacto dependerá muito da composição das medidas. "Se o anúncio se limitar a iniciativas já apresentadas, como combate a fraudes e reclassificação de emendas parlamentares, pode gerar decepção entre investidores", afirma.
Para Schneider, uma combinação de novas propostas será essencial para alcançar os R$ 30 bilhões e surpreender positivamente o mercado. Entre as medidas avaliadas, estão ajustes nas regras do seguro-desemprego, mudanças na multa do FGTS e a elevação da contribuição federal ao Fundeb. "Para impressionar, o ideal é que o pacote traga algo de caráter mais estrutural, na linha do que Haddad tem indicado", destaca.
Roberto Secemski, economista-chefe para o Brasil do Barclays, enfatiza a necessidade de avaliar a qualidade das medidas, e não apenas o montante. "É importante que o valor do corte reflita um esforço real e não apenas uma desaceleração do crescimento das despesas obrigatórias", observa. Secemski exemplifica que dobrar a parcela federal do Fundeb, de 30% para 60%, poderia liberar R$ 17 bilhões, mas ele destaca que essa economia seria reabsorvida por outras despesas discricionárias.
Para ele, o governo precisa ir além do simples controle de gastos, buscando credibilidade na meta de resultado primário e na estabilização da dívida pública. Medidas como a criação de um limite de crescimento de 2,5% para despesas significativas, que circulam como possibilidade, também não garantem impacto fiscal significativo. "Esses tetos temporários criam restrições artificiais, sem resolver a raiz dos aumentos de despesas vinculadas ao salário mínimo e benefícios indexados", explica Secemski.
Ítalo Franca, do Santander, concorda com a necessidade de sinalizar ao mercado um compromisso fiscal. Ele sugere que a meta inicial do governo deve ser economizar ao menos R$ 10 bilhões a R$ 15 bilhões já em 2025, embora defenda um pacote mais amplo, entre R$ 40 bilhões e R$ 50 bilhões, para cobrir 2025 e 2026. "Estamos em um ponto de inflexão. Um pacote robusto ajudaria a reduzir o prêmio de risco e ancorar expectativas em relação ao fiscal", afirma.
Alexandre Manoel, economista-chefe da AZ Quest, aponta que o verdadeiro ganho para os mercados virá se o governo sinalizar um caminho para reduzir o déficit fiscal estrutural. Ele lembra que a despesa primária do governo saltou para perto de 20% do PIB, e que seria essencial estabilizar essa proporção em um nível mais sustentável.
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