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      O escândalo do Banco Master: “Gestão temerária” e risco bilionário recaem sobre o contribuinte, diz economista

      José Luís Oreiro critica operação entre BRB e Banco Master, aponta omissão do Banco Central e alerta que sociedade pode pagar a conta

      (Foto: ABR | Divulgação )
      Dafne Ashton avatar
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      247 - Em entrevista concedida à TV 247, o economista e professor da Universidade de Brasília (UnB), José Luís Oreiro, fez duras críticas à operação que envolve a compra do Banco Master pelo BRB (Banco de Brasília), classificando o episódio como mais um caso de salvamento de instituição financeira, com potencial de gerar prejuízos expressivos à sociedade brasileira. “A gestão foi no mínimo temerária”, afirmou. Segundo ele, o modelo de negócios adotado pelo Master expôs o sistema financeiro a um risco sistêmico, e o desenrolar da transação tende a colocar o ônus sobre os ombros dos contribuintes.

      A operação, que prevê a aquisição da “parte boa” do Banco Master por um banco público, chamou a atenção de especialistas, sobretudo pelo fato de o Master ser, em número de clientes, maior que o BRB. “É estranho que um banco aparentemente menor compre outro com base de clientes superior. Isso, por si só, já merece questionamento”, disse Oreiro, ao lembrar que o Master possui mais de 10 milhões de clientes, enquanto o BRB tem cerca de 7 milhões. Mais preocupante, segundo o professor, é o fato de que, ao contrário do que ocorre em compras tradicionais, o atual controlador do Master, Daniel Vorcaro, não será afastado da gestão — ao contrário, manterá assento no conselho de administração do BRB. “Se fosse o BTG, como se especulou, ele receberia R$ 1 e um chute no traseiro. No BRB, está sendo premiado com cargo”, ironizou.

      Oreiro explicou que, desde 2021, o Banco Master iniciou um processo de rápida expansão ao captar recursos oferecendo rendimentos muito acima dos praticados no mercado, como títulos que pagavam até 140% do CDI. Para isso, montou uma rede agressiva de distribuição por corretoras, que recebiam comissões até oito vezes superiores à média. Essa combinação exigia aplicações em ativos de altíssimo retorno — e, consequentemente, altíssimo risco. “Era uma espécie de cassino. Quando dá certo, você consegue honrar suas obrigações e ainda lucra. Mas, geralmente, dá errado”, explicou.

      Entre os ativos escolhidos pelo Master, estavam precatórios e investimentos em empresas em situação pré-falimentar — aplicações com baixíssima liquidez. Oreiro apontou que o descompasso entre os prazos dos ativos e dos passivos do banco gerou um grave problema de liquidez. “Os precatórios são pagos pelo governo, mas você não sabe quando. Pode levar anos. E você tem debêntures vencendo agora, que precisam ser pagas”, alertou. Segundo ele, o Master recorre então à emissão de novas debêntures para honrar as antigas, o que se assemelha perigosamente a um esquema de pirâmide financeira. “Ele precisa captar sempre mais para pagar o que já captou. Isso lembra uma bicicleta financeira.”

      Esse modelo de captação, segundo o economista, tornou-se ainda mais insustentável com a alta da Selic. “Com a Selic a 14,25%, pagar CDI mais 40% significa um custo de captação absurdamente alto. E quanto mais sobe a taxa básica, menor o apetite dos investidores por risco. Eles já ganham bem com aplicações seguras. O plano de negócio do Vorcaro poderia parecer genial com a Selic a 2%, como em 2021, mas agora não para mais em pé”, avaliou.

      Além da fragilidade estrutural, o Banco Master teria se valido, segundo o professor, do Fundo Garantidor de Crédito (FGC) como escudo para atrair investidores. O fundo, formado por aportes do próprio sistema financeiro, garante aplicações de até R$ 250 mil por CPF. “O Master vendia produtos dizendo que, mesmo pagando 140% do CDI, o risco era nulo, porque o FGC cobria. Era o típico acordo caracu: o banco entra com a cara e o fundo com a parte menos nobre da expressão”, afirmou. Estimativas indicam que o Master teria emitido até R$ 25 bilhões em debêntures com essa promessa, o que corresponde a quase metade da capacidade total do FGC. “Se tiver que cobrir isso, o fundo pode não ter recursos suficientes para garantir outros bancos de médio porte, o que pode gerar uma corrida bancária em cadeia.”

      A operação entre BRB e Banco Master também expõe um possível arranjo político que sustentou o crescimento arriscado do banco. Oreiro lembrou que o Vorcaro montou um conselho consultivo com nomes de peso, como os ex-presidentes do Banco Central Henrique Meirelles e Gustavo Loyola, além de figuras influentes como Ricardo Lewandowski e Guido Mantega. E destacou que, no Congresso, o ex-ministro da Casa Civil de Jair Bolsonaro, Ciro Nogueira, atuou para ampliar o limite do FGC para R$ 1 milhão por CPF — medida que beneficiaria diretamente os planos do Master. “Ele se cercou de gente influente e criou uma teia. Se cair, vai levar muita gente junto.”

      Para Oreiro, o Banco Central, durante a gestão de Roberto Campos Neto, foi omisso. “É inadmissível que tenha permitido uma operação dessas sob os olhos de todos, sem intervenção. O Banco Central tinha o dever de fiscalizar, de impedir essa exposição de risco. Não o fez, e agora o problema caiu no colo do Galípolo”, criticou.

      Apesar do tamanho do escândalo, as ações do BRB subiram após o anúncio da compra. Oreiro acredita que isso se deve à percepção de que o BRB ficará apenas com a parte saudável do Master. “Para quem compra ações, pouco importa se a parte ruim vai para o fundo, para os fundos de pensão ou para o contribuinte. O mercado especula com a expectativa de lucro, não com julgamentos morais.”

      O economista fez ainda um alerta sobre os riscos de contaminação do sistema. “Há outras instituições semelhantes ao Master. Se o FGC for exaurido, o medo de que essas também não consigam honrar seus compromissos pode levar o sistema a uma crise real. Não estamos falando de um banco qualquer, são R$ 25 bilhões de passivos, 10 milhões de clientes e risco real para fundos de pensão.” Assista: 

       

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