Encarregado de Negócios da Embaixada da China critica tarifas dos EUA e reforça parceria estratégica com o Brasil
Em entrevista ao 247, o ministro Xing Wenju condena o unilateralismo de Washington e exalta a cooperação com o Brasil como modelo para o Sul Global
247 – O encarregado de negócios ad interim da Embaixada da China no Brasil, Xing Wenju, concedeu uma entrevista exclusiva ao Brasil 247 em que criticou duramente as tarifas unilaterais impostas pelos Estados Unidos sob o pretexto de “reciprocidade”. Para ele, tais medidas são uma expressão clara de hegemonia econômica e colocam em risco a ordem comercial internacional. Wenju também reitera o compromisso chinês com o multilateralismo e com a ampliação da parceria com o Brasil, destacando que o comércio bilateral atingiu recorde histórico de US$ 157,8 bilhões em 2024. Confira a entrevista completa:
Brasil 247 – Como o sr. avalia as medidas de “tarifas recíprocas” dos EUA?
Xing Wenju – Os Estados Unidos são beneficiários do atual sistema global de comércio. Após a Segunda Guerra Mundial, os EUA lideraram a configuração da arquitetura econômica e comercial global, o que impulsionou o crescimento da economia. Desse processo, os norte-americanos ficaram com a maior “fatia do bolo”, pois suas multinacionais empresas desfrutaram de lucros substanciais da globalização, enquanto os consumidores se beneficiaram de produtos com preços competitivos. O comércio de mercadorias norte-americano pode apresentar déficit, mas seu comércio de serviços mantém vantagem absoluta, com um superávit de quase US$ 300 bilhões em 2024, segundo dados da Organização Mundial do Comércio.
“Ao ignorar esse fato, os Estados Unidos impõem as chamadas tarifas ‘recíprocas’ sob pretexto de buscar ‘igualdade’ e ‘justiça’. Essa prática é, em essência, uma manifestação típica de unilateralismo, protecionismo e hegemonia econômica, cujo principal objetivo é preservar seus próprios interesses hegemônicos, em detrimento dos interesses legítimos de outros países.”
As tarifas “recíprocas” não vão “Make America Great Again”(Tornar os Estados Unidos Grandes Novamente), mas vão impactar fortemente o desenvolvimento econômico e comercial global. Por um lado, essas tarifas são resultado de uma “combinação errônea” de métodos de cálculo incorretos e lógica econômica equivocada. Uma projeção da Universidade Yale demonstra que cada família norte-americana sofrerá um prejuízo de US$ 4.200 por ano devido à aplicação dessas tarifas. Por outro lado, as tarifas “recíprocas” violam os princípios de nação mais favorecida e não discriminação da OMC, prejudicam o sistema multilateral de comércio baseado em regras e afetam severamente a normalidade da ordem econômica do Brasil e dos demais países do mundo.
247 – Como a China deve responder às “tarifas recíprocas” dos EUA?
Xing Wenju – A China condena e contesta veementemente as tarifas “recíprocas” dos Estados Unidos. Acreditamos que a guerra comercial não tem vencedores e que o protecionismo não é uma solução. O governo chinês tem enfatizado em diversas ocasiões que a cooperação entre as duas maiores economias pode resolver muitas questões importantes que os dois países e a comunidade internacional enfrentam.
“Esperamos que o lado dos EUA retorne ao caminho correto de diálogo e cooperação, abandone de imediato as medidas tarifárias unilaterais e negocie em condições de igualdade com todos os parceiros comerciais para lidar com as divergências de forma adequada.”
A economia chinesa mantém inalterada a tendência positiva no longo prazo e tem perspectivas promissoras. Em 2024, o PIB chinês se aproximou de 135 trilhões de yuan, com crescimento anual de 5%, um destaque excepcional entre as principais economias. O país contribui em cerca de 30% para o crescimento econômico mundial. Para 2025, estabelecemos mais uma vez a meta de crescimento em torno de 5% e o primeiro trimestre registrou uma alta de 6%.
“A China jamais aceitará qualquer tipo de pressão, ameaça ou chantagem.”
Nos últimos oito anos de guerra comercial com os Estados Unidos, acumulamos experiência rica de luta, já antecipamos uma nova rodada de sanções econômicas de Washington contra a China, e fizemos avaliações robustas sobre os possíveis impactos. Se os Estados Unidos insistirem em agir de forma unilateral, desconsiderando os interesses da comunidade internacional, a China certamente estará pronta para responder até o fim.
247 – O senhor acha que o mecanismo multilateral ainda consegue desempenhar um papel importante neste momento?
Xing Wenju – Preservar a ordem comercial global e a autoridade das regras multilaterais é fundamental para o crescimento estável da economia mundial e para a realização da prosperidade comum.
“Ninguém sai ileso da intimidação dos Estados Unidos. A história nos ensina que se retrocedêssemos aos tempos da ‘lei da selva’, sofreríamos consequências desastrosas.”
Ainda permanece viva na memória a dolorosa lição da Tarifa Smoot-Hawley de 1930 nos EUA, que desencadeou uma guerra tarifária mundial e uma longa recessão econômica global. Estamos, de fato, em um momento crítico na conjuntura do comércio global.
Neste momento de crise, concessões e recuos não trarão respeito, e o multilateralismo constitui a escolha sensata para superar as dificuldades atuais. A China apela a todos os países que unam forças para defender o sistema internacional centrado na ONU e o sistema multilateral de comércio com a OMC como núcleo.
“É fundamental aproveitar mecanismos multilaterais como G20, BRICS e OMC para coordenar posições e emitir uma voz uníssona contra o unilateralismo e as práticas de intimidação dos EUA.”
Ao mesmo tempo, pede que todas as partes mantenham consultas amistosas orientadas pelos princípios de não-discriminação, abertura e inclusão, evitando recorrer aos atos protecionistas e ao aumento recíproco de tarifas.
O Brasil é o maior país em desenvolvimento do hemisfério ocidental e um importante mercado emergente. No ano passado, durante sua presidência do G20, o Brasil promoveu de forma proativa respostas aos desafios econômicos globais e contribuiu com a força do Sul Global para o desenvolvimento mundial. Este ano, na qualidade de presidente do BRICS, o país vai sediar a cúpula do grupo.
“A China acredita que o Brasil continuará a demonstrar sua liderança e desempenhará um papel significativo na resposta conjunta às ameaças unilaterais e na promoção das reformas do sistema de governança global.”
247 – Qual será o impacto das “tarifas recíprocas” na cooperação econômica e comercial entre o Brasil e a China?
Xing Wenju – Nos últimos 50 anos, China e Brasil superaram a grande distância geográfica e desbravaram um caminho correto de convivência entre grandes países em desenvolvimento, baseado em respeito, amizade, benefícios recíprocos e parceria de ganhos mútuos. Esse relacionamento serve como modelo de relações entre países do Sul Global e grandes nações em desenvolvimento.
“A cooperação econômica e comercial entre os dois países aprimora-se de forma constante e alcança resultados notáveis, o que fornece um importante impulso para o desenvolvimento e a modernização de ambos.”
Em 2024, o comércio bilateral atingiu um novo recorde histórico de US$ 157,8 bilhões. No primeiro trimestre deste ano, registrou-se um crescimento superior a 5% em comparação ao mesmo período do ano passado, que já havia estado em um nível elevado. Cada vez mais empresas chinesas estão investindo e fazendo negócios no Brasil, em setores como infraestrutura, energia, automóveis, eletrodomésticos e economia digital. Junto com parceiros brasileiros, contribuem para a nova industrialização e o desenvolvimento socioeconômico do Brasil.
“Caminhar com a China significa caminhar ao lado de oportunidades, acreditar na China é acreditar no amanhã!”
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