'Brexit americano', diz Ian Bremmer, da Eurasia, sobre 'tarifaço' de Trump
Especialistas afirmam que a guerra comercial lançada por Trump afasta os EUA do resto do mundo e encerra a era da globalização
247 - A nova ofensiva tarifária do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, provocou forte reação entre economistas e analistas financeiros. Para muitos, o pacote de medidas anunciado pela Casa Branca representa um divisor de águas na ordem econômica mundial e pode ser comparado ao impacto do Brexit no Reino Unido. Reportagem do Estado de S. Paulo destacou a crescente preocupação com os riscos de uma recessão global, estimada em até US$ 30 trilhões, segundo o ex-secretário do Tesouro americano Lawrence Summers.
Trump propôs a aplicação de uma tarifa mínima de 10% sobre todos os produtos importados pelos EUA, além de novas alíquotas recíprocas para os principais parceiros comerciais. O plano, conforme defendido pela Casa Branca, visa “corrigir um sistema injusto” que, na avaliação do governo, favorece países que adotam práticas desleais. “O mundo está roubando os americanos”, tem reiterado Trump em seus discursos.
A resposta dos mercados foi imediata: mais de US$ 2 trilhões evaporaram dos mercados acionários globais nas horas seguintes ao anúncio, segundo o chefe de análise financeira da AJ Bell, Danni Hewson.
Estratégia planejada antes da eleição - Embora Trump tenha sido empossado para seu segundo mandato em janeiro de 2025, as bases do novo pacote econômico já estavam delineadas desde o ano anterior. Stephen Miran, atualmente chefe do Conselho de Consultores Econômicos da Casa Branca (CEA, na sigla em inglês), detalhou a estratégia em um relatório com mais de 40 páginas publicado em novembro passado, quando ainda era estrategista sênior da Hudson Bay Capital.
No documento, batizado informalmente de “Acordo Mar-a-Lago”, Miran propõe um plano baseado em três pilares: tarifas, defesa e desvalorização do dólar. Segundo ele, os EUA precisam reduzir a sobrecarga de sustentação do sistema global. “Trump pode reconfigurar os sistemas financeiros e de comércio global para o benefício da América”, escreveu o conselheiro econômico, destacando que seu estudo “não é uma defesa de políticas”, mas uma análise estratégica.
O relatório sugere, por exemplo, que bancos centrais estrangeiros sejam pressionados a substituir títulos do Tesouro americano de curto prazo por papéis de longo prazo. O objetivo seria desincentivar o uso do dólar como reserva mundial, medida que, segundo Miran, corrige o desequilíbrio no comércio global.
Repercussões e críticas - As ideias de Miran encontraram forte resistência entre economistas renomados, inclusive nos EUA. Larry Summers, ex-chefe do Conselho Econômico Nacional na administração Obama, foi direto: “nunca antes uma hora de retórica presidencial custou tanto a tantas pessoas”. Ele estima perdas econômicas globais de até US$ 30 trilhões com as medidas de Trump, que classificou como “as mais caras e masoquistas” das últimas décadas.
Instituições financeiras também começaram a revisar seus cenários. A consultoria britânica Capital Economics afirmou que medidas mais extremas do plano poderiam elevar drasticamente os juros dos títulos públicos americanos e abalar a credibilidade do dólar. Para o CEO do deVere Group, Nigel Green, “as tarifas de Trump colocam a credibilidade dos EUA em jogo”.
A própria Capital Economics reduziu sua projeção para o índice S&P 500, de 7 mil para 5,5 mil pontos, e embora avalie que a adoção total do plano seja improvável, seus analistas Vicky Redwood e Andrew Kenningham alertam: “nunca se pode dizer nunca com Trump”.
Volatilidade e risco global - Economistas europeus também expressaram preocupação. O ABN AMRO, por meio do seu economista-chefe para os EUA, Rogier Quaedvlieg, afirmou que o pacote proposto seria “inflacionário e reduziria o crescimento” no curto prazo.
Já o Wells Fargo avalia que o novo conjunto de medidas não apenas isola os EUA, como também pode acelerar a fragmentação do comércio global. Ian Bremmer, presidente do Eurasia Group, comparou o movimento ao Brexit: “é uma espécie de ‘Brexit dos americanos’”. O Wall Street Journal foi ainda mais enfático: “o fim da era da globalização”.
Diante das turbulências, cresce o temor de que os EUA estejam embarcando em uma rota solitária que reescreve as regras do comércio mundial. Se essa nova doutrina se consolidar, não apenas a economia global pode entrar em recessão, como o papel dos EUA como liderança financeira internacional também será colocado em xeque.
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