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    Conselho Federal de Medicina leva ao Senado posições sem evidências científicas e defende PL da Gravidez Infantil

    Sem governo ou campo progressista, debate sobre aborto vira palco para conservadores

    Fachada do Conselho Federal de Medicina (CFM) (Foto: CFM)

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    Brasil de Fato - Em debate realizado no plenário do Senado Federal nesta segunda-feira (17), sob presidência do senador bolsonarista Eduardo Girão (Novo-CE), membros do Conselho Federal de Medicina (CFM) defenderam a proibição da realização de aborto após 22 semanas de gestão, mesmo nos casos permitidos por lei.  

    O evento serviu para a defesa do PL 1904/2024, batizado de PL da Gravidez Infantil, que busca equiparar o aborto de um feto viável ao crime de homicídio, mesmo nos casos em que a interrupção da gravidez está prevista em lei. O texto causou a revolta de movimentos de mulheres e da sociedade em geral nos últimos dias, após a aprovação do regime de urgência da tramitação da matéria.  

    O Ministério da Saúde foi convidado para o debate, mas não compareceu. Todos os outros movimentos convidados para a sessão se identificavam contrários à prática do aborto.    

    Ao Brasil de Fato, o Ministério da Saúde informou que, "devido a incompatibilidades na agenda, a Ministra da Saúde, Nísia Trindade, não pôde comparecer, nesta segunda-feira (17), à sessão de debates temáticos sobre assistolia fetal no Senado Federal". De acordo com a assessoria de imprensa do ministério, a "ausência foi comunicada formalmente no dia 13 de junho à Casa Legislativa" e ressaltou que a Assessoria Especial de Assuntos Parlamentares do Ministério da Saúde acompanhou o debate, "dada a relevância do tema para a pasta".

    No início da sessão, foi apresentada uma performance que narrava supostas "súplicas" de bebês a ponto de serem abortados, com gritos, choros e expressões religiosas de condenação à prática do aborto. O senador Girão levou ao plenário réplicas de fetos e chegou a ser impedido pela direção da TV Senado de reproduzir imagens apelativas com o detalhamento do procedimento de interrupção da gravidez.  

    Convidado a subir na tribuna, presidente do CFM, José Hiran da Silva Gallo, fez uma defesa da resolução 2.378/2024, questionada no Supremo Tribunal Federal (STF) na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 1141), movida pelo Psol. Alexandre de Moraes, ministro da corte, suspendeu a resolução do conselho. 

    Em seu discurso, Gallo usou termos como "banalização da vida", "crueldade", "proteção da vida", citou estudos científicos sobre a viabilidade fetal sem mencionar fontes e proferiu frases de efeito emocional.  Colocou a culpa por uma suposta "insensibilidade" na "modernidade", atacou a autonomia da mulher, afirmou que fetos na 22ª semana de gravidez são "seres humanos formados" e se autodenominou "médico, marido, pai, avô".  

    Diversos outros oradores se referiram ao aborto legal como "assassinato".  

    Posição não representa o conjunto dos médicos - Com eleição de conselheiros marcada para agosto deste ano, médicos articulam o movimento "Muda CFM", em contraponto às posições conservadoras da atual gestão. 

    "As últimas gestões do CFM se caracterizaram por posições e iniciativas em defesa de uma suposta 'autonomia' médica, endossando medidas distanciadas das evidências científicas, baseadas em crenças propagadas no meio digital e alienadas da segurança dos pacientes, dos princípios éticos e das próprias bases da medicina", diz um trecho do manifesto público de criação do movimento. 

    Especificamente sobre o tema do PL 1904, o movimento divulgou nota em que defende que o tema da interrupção da gravidez deve "ser tratado como uma política de saúde pública", com acolhimento às vítimas "em tempo oportuno". O grupo também critica as posições ideológicas tomadas pela atual gestão do Conselho.   

    "O CFM não pode ser uma linha auxiliar para grupos políticos do Congresso, sobretudo contra o interesse coletivo. Vimos o quão desastroso foi este alinhamento acrítico e, muitas vezes, oportunista durante a pandemia de covid-19", diz o texto. 

    Banalização da gravidez adolescente - Lenise Garcia, representante de um dos grupos contrários ao aborto, chegou a naturalizar a gravidez na adolescência. Em seu discurso, afirmou que meninas estão preparadas para serem mães quando se tornam férteis. Em anedota pessoal, elogiou a família de sua bisavó, que teria se casado aos 14 anos e tido "uma família feliz, de muitos filhos". Não houve, no entanto, informação sobre a idade em que a representante do grupo começou a planejar em ter filhos.

    Ao contrário do que diz Garcia, os dados mostram que gravidezes precoces são um perigo para a saúde. Na Nota informativa aos tocoginecologistas brasileiros sobre o aborto legal na gestação decorrente de estupro de vulnerável, a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) informa que gestações em crianças e adolescentes apresentam maior risco de complicações como "anemia, pré-eclâmpsia e eclâmpsia, diabetes gestacional, parto prematuro e partos distócicos". O documento também diz que "as taxas de mortalidade materna entre as gestantes menores do que 14 anos chegam a ser 5 vezes maiores do que entre gestantes entre 20-24 anos".

    Bolsonarista de carteirinha - Em fevereiro de 2023, o presidente do CFM, José Hiran da Silva Gallo, criticou medidas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que determinam a obrigatoriedade do uso de máscaras durante a pandemia da covid-19 e afirmou que a medida "jamais pode ser imposta a pessoas que não compartilham de tais ideologias ou comportamentos". 

    Ainda no contexto da pandemia de covid-19, o Ministério Público Federal (MPF), provocado pela deputada Luciene Cavalcanti (Psol-SP), chegou a pedir explicações ao CFM, em janeiro de 2024, após o conselho realizar uma pesquisa com os médicos associados sobre a obrigatoriedade da vacinação infantil contra a covid-19 na faixa etária de 6 meses a 4 anos de idade.  

    Na ocasião, o conselho questionou os profissionais da saúde se os pais e responsáveis teriam o direito de não optar pela imunização de suas crianças, em direção contrária às recomendações do Ministério da Saúde e da Anvisa.  

    Antes disso, em 2018, Gallo publicou artigo no site do Conselho Regional de Medicina de Rondônia, seu estado de origem, comemorando a vitória do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nas eleições daquele ano. No texto, o médico afirmou: 

    "O recado do eleitorado é um só: o medo diante dos poderosos de plantão deu lugar à esperança de que um novo país seja construído com base na ética, na justiça e na escuta de todos os brasileiros, livres para expressar seu pensamento sem temer ameaças de retaliação. Esse é o novo Brasil que o cidadão espera ver de agora em diante."

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