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      Economistas citados por Trump repudiam uso político de seus estudos: "é uma loucura"

      Pesquisadores criticam distorções promovidas pelo governo dos EUA para justificar a guerra comercial de Donald Trump

      O presidente dos EUA, Donald Trump, faz comentários sobre tarifas no Rose Garden na Casa Branca em Washington, D.C., EUA, 2 de abril de 2025 (Foto: REUTERS/Carlos Barria)
      Guilherme Levorato avatar
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      247 - A nova onda tarifária promovida pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em seu segundo mandato, vem sendo acompanhada de uma estratégia comunicacional que recorre a estudos acadêmicos para embasar decisões econômicas polêmicas. O problema, segundo os próprios autores das pesquisas mencionadas pela Casa Branca, é que os trabalhos têm sido distorcidos, citados fora de contexto ou usados de forma reducionista, relata a Folha de S. Paulo.

      Um dos primeiros a ser surpreendido foi Anson Soderbery, professor associado de economia na Universidade de Purdue. No dia 3 de abril, seu telefone não parou de tocar. "Foi surreal. As pessoas queriam saber como eu tinha me metido naquilo, se tinha envolvimento com o governo. E eu não estive envolvido com nada", afirmou.

      A Casa Branca publicou, em seu site oficial, uma explicação sobre como as tarifas de importação foram calculadas. Entre as referências, está o artigo de Soderbery intitulado "Elasticidade no comércio, heterogeneidade e tarifas otimizadas", publicado no Journal of International Economics em 2018. Para além da surpresa com a citação, o economista apontou que seu nome foi grafado de forma errada ("Soderberry") e criticou a interpretação do conteúdo. “Eles reduziram toda a economia a um único parâmetro. É uma loucura”, declarou.

      Segundo ele, o artigo trata de um contexto específico e não pode ser usado para justificar uma política tão ampla. “Era uma análise feita sobre um tema específico. Não sei como eles chegaram a esta fórmula para tentar um equilíbrio maior no comércio e não uma aposta na eficiência econômica. Se este era o objetivo, gostaria que tivessem pensado melhor no assunto”, completou.

      Outros economistas também manifestaram incômodo com a forma como suas pesquisas foram utilizadas. Robert E. Scott, do Economic Policy Institute (EPI) e professor da Universidade de Direito de Columbia, afirmou por meio da assessoria: “Trump está impondo tarifas basicamente em todas as importações, mais de US$ 3 trilhões, depois de apenas dois meses de mandato. Tarifas podem ser uma ferramenta legítima e útil para uma política industrial bem definida, mas algo tão amplo e que muda de maneira significativa a média de tarifas nos Estados Unidos não é inteligente”.

      A crítica do EPI se estende ao uso parcial de trechos de artigos. Um deles, assinado por Scott e Adam S. Hersh, afirmava que o aumento de tarifas não gera inflação e que sua retirada pode prejudicar cadeias produtivas internas. Porém, o instituto destaca que esse raciocínio vale somente para os setores de aço e alumínio, não para toda a economia. “É difícil ressaltar o bastante o quanto o anúncio das mudanças tarifárias [do segundo mandato de Trump] foram radicais”, conclui a nota.

      A controvérsia não é inédita. Durante o primeiro mandato, em 2017, Scott já havia sido citado 18 vezes em rodapés de discursos presidenciais. À época, reagiu com veemência: “as pessoas têm me perguntado se eu concordo com as receitas políticas de comércio do presidente. A resposta simples é não! Ver um magnata corporativo como salvador é uma piada. Porque as soluções que o próprio Trump propõe mostram que ele não entende o que é um regime inteligente de comércio”.

      A Casa Branca também buscou apoio em postagens antigas de integrantes do governo anterior. Janet Yellen, atual secretária do Tesouro sob a administração de Joe Biden, foi citada por defender tarifas contra a China. No entanto, em março, Yellen criticou duramente a nova política de Trump durante evento na UNSW Business School, na Austrália: “o que essas tarifas ameaçam fazer é causar recessão nos Estados Unidos por reduzir investimento”.

      O economista espanhol Pau Pujolas, da Universidade McMaster, nos Estados Unidos, também contestou publicamente a apropriação de seu trabalho. Ao lado de Jack Rossbach, ele escreveu o artigo "Déficits comerciais com guerras comerciais", publicado no SSRN. Ambos foram citados na justificativa para o novo pacote tarifário. Em entrevista ao jornal britânico The Times, Pujolas foi taxativo: “as tarifas de Trump são uma besteira que vão levar o mundo a uma recessão. Se eu estou certo de alguma coisa neste momento é que o mundo está no caminho de uma recessão”.

      Já o pesquisador argentino Alberto Cavallo, do MIT e filho do ex-ministro da Economia da Argentina Domingo Cavallo, usou as redes sociais para se manifestar. Em uma postagem na rede X, antigo Twitter, afirmou: “não está totalmente claro como eles usaram nossas descobertas. Com base em nossa pesquisa, a elasticidade dos preços de importação em relação às tarifas está mais próxima de 1. Se esse número fosse usado, em vez de 0,25, as tarifas recíprocas implícitas seriam cerca de quatro vezes menores”.

      Para Soderbery, os primeiros meses do novo mandato de Trump já indicam um cenário de desorientação econômica. “É difícil avaliar uma política de comércio quando um objetivo claro não está determinado”, concluiu.

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